– Eu não acredito que uma pessoa que pensa que ir em uma passeata pode mudar o futuro do Iraque seja incapaz de lutar pelo grande amor de sua vida. Vamos, menina! Me dê o material, atravesse a rua e pegue o outro ônibus.
– Mas e se não der certo, se ele não aparecer?
– Dentro de uma hora eu vou estar lá para te buscar. Você tem que tentar, se não nunca vai saber como seria…
Foi assim que eu atravessei a rua, não só em seu asfalto, mas cruzando a minha coragem. E deste jeito que minha mãe, em um dia em que me acompanhava para pegar o ônibus que me levaria à faculdade, confiscou meus livros e fez com que eu escrevesse minha própria história. Entrei na cápsula que me levaria até o Metrô Saúde e ELE não estava lá. Mas ela sim, escondida em seu carro, pronta para segurar a mão de uma pequena menina já com seus 20 e poucos anos. O garoto apareceu 2 meses depois para se tornar o genro preferido pela eternidade.
Sempre que falo desta minha amiga que quis a vida que fosse também minha – a melhor – mãe, na nossa intimidade cotidiana lembro deste episódio. Fomos cúmplices e isso eu quero ter com minha filha também.
Poucos são meus medos, mas como mera mortal, não ter uma mão para segurar não é fácil:
– E como vai ser se um dia você for embora? Eu não vou suportar!
-Vai, vai sim. Você é forte até demais.
E nesta trajetória de viver, a própria vida preparou para mim um momento decisivo. Foi como se os meus passos, ainda incertos e dependentes daquelas duas mãos que me seguravam, fossem se tornando mais firmes, solitários. Como quando o filho que está na bicicleta esquece as rodinhas, sente que não há ninguém mais o segurando em seu caminhar. Era pedalar ou cair.
Caí, o tombo foi feio. Por um momento, não sabia como me levantar. Mas foi quando uma mão, destas que encontramos pela vida e honramos chamar de Amizade me colocou de pé, literalmente, quando da cama me era impossível levantar. Eu não tinha chão que me suportasse, paredes para me amparar, mas elas, aquelas bençãos compostas por dedos e corações não paravam de chegar. E aos poucos, com palavras, escolhendo a roupa que eu usaria, me abraçando para me levantar da cama, me esperando durante o banho porque eu tinha medo, trazendo café, bolacha, conforto… segurança.
Mãos que gritavam que me amavam, estas que ficaram grudadas às minhas para que eu conseguisse trabalhar. Firmeza que me abraçava em sorriso, que permitia meu silêncio, que só com a presença diziam “Estamos juntos”. Mãos em forma de Deus, de família, de amigos que moram longe, daqueles que cresceram junto comigo, que juntas comemos goiabas na faculdade, que descobriram o amor pelo amor e a arte pelo prazer em um site de camisetas, amor grande da vida toda que só Marisa Monte sabe cantar, que aprenderam a contar histórias comigo na pós-graduação, que amam crianças que de nós não nasceram, mas que criamos com esperança. Curumins que com um abraço iluminaram e me encorajaram.
E assim, aos poucos, fui colocando minhas próprias mãos no chão para tatear o mundo. Depois senti os joelhos tomando posição, as pernas se afastando, o tronco erguendo, a cabeça enxergando um caminho.
E levantei, com uma força que surgiu do amor. E me pus a correr. E toda vez em que penso em desistir, sofrer, não caminhar mais, porque a dor é grande, começam a surgir rostos, que tomam o formato de todas aquelas mãos me aplaudindo, gritando “Vai, não desiste”, “Vai, você consegue”, “Vai, estamos aqui!”. E continuo meu trajeto.
A Deus que a cada dia me mostra o verdadeiro amor e que me embala em suas mãos. À minha família que caminha comigo de mãos dadas. Ao meu amor que me abraça com suas mãos. E aos meus amigos este texto como mãos que se unem, cabeça que se inclina e voz, que ainda em palavras, sussurra um “Muito Obrigada!”
Nath Gostei muito,Parabéns!
Na. eu Adorei. e fico muito feliz em ver o quanto vc. é forte. tenho saudades da menininha ruiva. que sempre gostou de meus colares, batons. bjsss Tia Dô
Tia Dô,
Ainda hoje tenho a caixinha de música que você me deu!
Saudades grandes e obrigada por este carinho de toda uma vida. =*
Olá!
Meu nome é Bruno e caí bem de pára-quedas aqui jogado pelo Google numa pesquisa com “sesc curumim santo andré”. No meio de um monte de resultados formais, fiquei curioso com um que dizia “contadora de histórias” e cliquei nele.
Eu li tudo que tem nessa página e não pude ir além dela porque o horário e as responsabilidades me mandaram parar, mas não pude não deixar um recado.
Que delícia te ler! Tudo tão leve, no meio de tanta coisa pesada que a gente lê por aí.
Senti a tristeza e a saudade boa ao falar de sua mãe, e também o seu medo de ir encontrar ELE, enquanto a mãe a protegia de longe. Me identifiquei com o “acredito em Deus, sem levantar bandeiras” e com a sua reação com o mendigo que conversava com a câmera. Se eu não estivesse com um olho já meio fechando compartilharia a minha história que tive com um mendigo muito bacana e com voz de locutor que conheci perto de onde almoçava, há alguns meses. haha
Faço aniversário em 22 de Abril e esse ano, diferentemente dos outros, foi um dia bem triste pra mim, era um domingo sem graça. E fiquei feliz ao saber que enquanto eu tinha um dia não tão bom por aqui, uma moça de 66 anos depositava o sonho dela numa árvore de desejos aqui perto.
Lendo os textos eu entendi que você trabalha ou trabalhava no SESC. Como conheço bem por ali, foi bem fácil conseguir visualizar o teatro, com a Nathalia e o R. pedindo desculpas a São José pela uva, mesmo não conhecendo nenhum dos dois. Mas criei sem querer a imagem aqui na minha cabeça. E, sinceramente, se São José existe mesmo, tenho certeza que ele perdoou o suco de uva. Tinha bastante sinceridade ali, então nem se preocupem. Talvez até por isso tenha provocado tanto o garoto com uvas mais frequentes nos lanches.
E o Alexandre… não sabia da história dele, há algum tempo não o vejo por lá. Mas tenho quase certeza que já pedi informações a ele quando comecei a frequentar o SESC, pois achava que ele era o segurança. Pelo menos, fui bem informado em relação ao que queria.
Enfim, obrigado pela leitura. pelo trabalho que faz com as crianças e por essa visão bacana deste louco mundo em que vivemos.
Continuarei lendo em breve, tenho certeza que tem muita história legal ali nas “entradas mais antigas”.
Acabei escrevendo um pouco de demais, mas paro por aqui porque hoje já é amanhã.
Beijo!
Bruno,
Que coisa boa ler todas estas palavras. E o mais engraçado é que você conhece o SESC e conseguiu visualizar tudo. Este é um espaço que reservei para contar estes pequenos milagres cotidianos. Temos a péssima mania de acostumar nosso olhar, mas se o deixarmos livre, ele será capaz de registrar momentos como estes. Fico feliz que tenha gostado e por ter recebido esta mensagem tão encorajadora. =)
Beijos!
“(…) estes pequenos milagres cotidianos. Temos a péssima mania de acostumar nosso olhar, mas se o deixarmos livre, ele será capaz de registrar momentos como estes.”
Sábias palavras. 😉
E é assim que tem que ser. Não apenas registrando-os mas, sempre que possível participando deles também.
E assim segue o jogo.
Beijo!